sexta-feira, maio 28, 2010

Os 23 da Copa (VI) - Gilberto: outra vez na janela do bonde

Uma das melhores revelações do Tio Sam (tradicional equipe carioca de futsal), Gilberto era, porém, muito mais conhecido no início de sua carreira apenas como "o irmão do Nélio". O mano mais velho até teve um início promissor no futebol, fazendo parte de uma geração vitoriosa nos juniores do Flamengo e depois vestindo a lendária camisa 10 titular por algumas temporadas. Contudo, perdeu-se a partir de meados da década de 90 em virtude da indisciplina e do gênio difícil em campo (era acusado por muitos adversários de ser extremamente desleal e maldoso).

Após sair das quadras e passar algum tempo nos times menores no América, Gilberto chegou ao Rubro-Negro em 1996, quando Nélio ainda se encontrava na Gávea, mas já alternando entre entradas e saídas da equipe titular. Mostrou bom futebol, de categoria nos avanços ao ataque e segurança na marcação, sendo titular na conquista invicta do Estadual do mesmo ano.

Mas a sorte mudou já no segundo semestre. O Flamengo fez um Brasileiro medíocre, sofrendo várias goleadas e ficando muito longe da zona de classificação à fase final. E Gilberto acabou perdendo a posição de titular para o jovem Athirson, então mais uma grande promessa oriunda da tradicional "fábrica de craques" rubro-negra.

Após passar mais uma temporada quase inteira no banco, em 1997 (tendo oportunidade de atuar apenas nas convocações de Athirson para a Seleção Sub-20), Gilberto acabou mudando de ares. Foi para o Cruzeiro e recuperou seu bom futebol. Destaque da ótima, porém azarada equipe comandada por Levir Culpi em 1998 (campeã mineira e vice em outros três campeonatos, Copa do Brasil, Brasileiro e Copa Mercosul), chamou a atenção da tradicional Internazionale de Milão.

No time que também contava com Ronaldo, Gilberto teve pouquíssimas oportunidades e não chegou a corresponder quando as recebeu. Retornou ao Brasil seis meses depois, desta vez para vestir a camisa do Vasco.

Mostrou novamente um bom futebol em São Januário. Mas novamente o azar lhe perseguiu: passou longo tempo se recuperando de uma grave contusão no joelho, perdendo praticamente toda a temporada de 2000. Com a crise financeira começando a tomar conta do clube e os salários começando a atrasar, tomou parte na grande barca de medalhões que deixou o clube alvinegro ao longo de 2001.

Indicado pelo técnico Tite, chegou ao Grêmio. Teve ótima passagem por Porto Alegre (com direito à sua primeira convocação para a Seleção, disputando a Copa das Confederações), ainda mais depois que, no Brasileiro de 2003, foi deslocado para o meio-campo e foi um dos nomes decisivos para o Tricolor escapar do rebaixamento. Ao final da competição, seu contrato encerrou-se e foi arriscar a sorte no emergente São Caetano, treinado por seu velho conhecido Tite.

O treinador logo caiu e foi substituído por Muricy Ramalho. Mas Gilberto, também fixado no meio-campo do Azulão, foi um dos pilares da equipe que conquistou o inédito título paulista. Tão logo acabou o campeonato, transferiu-se para o Hertha Berlim da Alemanha, valendo-se de uma cláusula que obrigava o São Caetano a liberá-lo sem custos em caso de proposta européia vantajosa.

Gilberto demorou um pouco a se encontrar na capital alemã. Seu futebol acabou surgindo justamente no meio da temporada da Bundesliga, época em que o frio intenso domina a Europa e os gramados ficam muitas vezes totalmente branquinhos. Por causa disso, a torcida lhe deu o sugestivo apelido de "Homem da Neve". A boa fase acabou lhe valendo o retorno à Seleção, fazendo parte do grupo que conquistou a Copa das Confederações em 2005, competição em que disputou quatro das cinco partidas como titular, inclusive a final contra a arquirrival Argentina. A essa altura, já há muito tempo as coisas haviam se invertido: Nélio é que passara a ser "o irmão do Gilberto"...

Conquistou sua vaga no Mundial da Alemanha praticamente aos 45 do segundo tempo, valendo-se principalmente da má fase do concorrente Gustavo Nery no Corinthians. Como já era esperado, não pôde alimentar esperanças de ganhar a posição de Roberto Carlos, mas aproveitou a única chance, diante do Japão, ocasião em que o camisa 6 e outros titulares foram poupados, para fazer uma boa atuação e até deixar um golzinho.

Com a chegada de Dunga, Gilberto continuou sendo chamado, apesar da idade avançada que teria (como tem) por ocasião da Copa de 2010, disputando posição com jovens como Marcelo, Adriano e Filipe Luís, ascendentes como André Santos e Juan Maldonado, e até mesmo improvisados, caso do folclórico Richarlyson. Todos ficaram pelo caminho. E após mais de um ano sem qualquer convocação, marcado ainda por uma infeliz passagem pelo Tottenham (onde ficou boa parte do tempo relegado ao time B) e o retorno ao futebol brasileiro para uma segunda passagem pelo Cruzeiro, Gilberto acabou de forma surpreendente retornando à Seleção e mais uma vez se garantindo num Mundial em cima da hora.

Deverá travar boa briga pela posição de titular com Michel Bastos, outro lateral-esquerdo de origem que, contudo, há muito tempo, não atua na posição. E seja quem for o vencedor, terá muito trabalho para convencer a opinião pública, ressabiada com a escassez de opções numa posição que até bom pouco atrás era farta em oferta de bons jogadores para a Seleção.


Gilberto da Silva Melo
lateral-esquerdo
Rio de Janeiro (RJ), 25.04.1976
1,80 m
78 kg
Clubes: América-RJ (1993 a 1995), Flamengo (1996/97), Cruzeiro (1998 e desde 2009), Internazionale-ITA (1999), Vasco (1999 a 2001), Grêmio (2002/03), São Caetano (2004), Hertha Berlim-ALE (2004 a 2008) e Tottenham-ING (2008/09).
Títulos: carioca (1996) pelo Flamengo; mineiro (1998) pelo Cruzeiro; brasileiro (2000) e da Copa Mercosul (2000) pelo Vasco; paulista (2004) pelo São Caetano; da Copa das Confederações (2005) e da Copa América (2007) pela Seleção Brasileira.
Jogos pela Seleção: 33 (1 gol)
Participação em Copas:
2006 (5º lugar) - 1 jogo, 1 gol

Foto: CBF.com.br

Os 23 da Copa (V) - Gilberto Silva: ainda uma muralha?

As categorias de base do tradicional América Mineiro têm rendido bons frutos nos últimos anos, entre eles a conquista da Copa São Paulo de Juniores em 1996. Entre os jogadores revelados pelo Coelho neste período, o principal é sem dúvida Gilberto Silva.

O volante logo conquistou um lugar entre os profissionais do clube, sendo um dos principais destaques na conquista da Série B em 1997. O América teve passagem fugaz pela elite, sendo rebaixado já no ano seguinte, mas Gilberto mostrou qualidades e logo passou a ser objeto de desejo dos arquirrivais Atlético e Cruzeiro.

Após uma longa "novela", que envolveu até briga judicial, o Galo ganhou a disputa e contratou a jovem promessa em janeiro de 2000. Gilberto logo mostrou que era uma realidade, graças a um futebol simples e eficiente, de boa técnica e precisão nos passes, garantindo a proteção à defesa sem maiores estardalhaços. Chegou até a ser improvisado na zaga, mas seu lugar era mesmo a cabeça-de-área.

Depois da grande participação no Brasileiro de 2001, sendo escalado para quase todas as seleções de melhores do campeonato e levando o Atlético às semifinais, sua convocação para a Seleção Brasileira passou a ser exigida por toda a opinião pública mineira. Sua estréia ocorreu na vitória sobre o Chile (2 x 0), em Curitiba, pelas Eliminatórias da Copa da Coréia e Japão, entrando no segundo tempo.

Ganhou um lugar entre os 23 jogadores do técnico Luiz Felipe Scolari após ótimas atuações nos amistosos preparatórios. Mas o que estava bom ia ficar ainda melhor. A triste contusão do titular e capitão Emerson, na véspera da estréia contra a Turquia, deu a Gilberto a chance de ouro de sua carreira. E ele não decepcionou: atuou todas as sete partidas, sem jamais ser substituído, e foi talvez o jogador mais regular da Seleção em toda a Copa.

Durante a vitoriosa campanha do pentacampeonato, o técnico francês Arsène Wenger mostrou-se muito impressionado com o futebol discreto porém eficiente do volante brasileiro. O treinador do Arsenal deu-lhe um apelido bastante apropriado: Invisible Wall ("Parede Invisível") e não sossegou até finalmente levar o jogador para a tradicional equipe londrina, por 9 milhões de dólares, tão logo terminou o Mundial.

No duro futebol inglês, Gilberto logo conquistou a torcida com sua categoria na marcação, recebendo pouquíssimos cartões amarelos e eventualmente fazendo belos gols na frente. Foi peça importante na grande equipe que foi campeã da Premier League de 2003/04 e acumulou longa invencibilidade.

Depois disso, alguns percalços. Gilberto sofreu algumas contusões que lhe custaram a posição de titular na Seleção, perdida para o antigo titular Emerson. Em 2006, na fracassada campanha da equipe de Parreira na Alemanha, praticamente revezaram-se na disputa pela cabeça de área. De certa forma, o mineiro terminou vencedor, atuando na eliminação diante da França e sendo mantido no grupo com a chegada de Dunga.

Após perder a posição no Arsenal, acabou negociado com o Panathinaikos, da Grécia, em 2008. Mas seu lugar na Seleção segue intocável, apesar das críticas de boa parte de imprensa e torcida, que lhe apontam uma certa decadência técnica e lentidão no combate, embora não tenha até hoje chegado efetivamente a comprometer com a camisa amarela.

Superar a desconfiança dos críticos e corresponder em seu terceiro (e provavelmente último) Mundial é o desafio de Gilberto Silva, mostrando que, apesar de já longe do auge, pode ainda assim ser uma útil, embora silenciosa, peça no tabuleiro do técnico Dunga.


Gilberto Aparecido da Silva
volante
Lagoa da Prata (MG), 07.10.1976
1,84 m
74 kg
Clubes: América-MG (1996 a 1999), Atlético-MG (2000 a 2002), Arsenal-ING (2002 a 2008) e Panathinaikos-GRE (desde 2008).
Títulos: brasileiro da Série B (1997) pelo América-MG; mineiro (2000) pelo Atlético; inglês (2004) e da Copa da Inglaterra (2003 e 2005) pelo Arsenal; grego (2010) e da Copa da Grécia (2010) pelo Panathinaikos; mundial (2002), da Copa América (2007) e da Copa das Confederações (2005 e 2009) pela Seleção Brasileira.
Jogos pela Seleção: 91 (4 gols)
Participação em Copas:
2002 (campeão) - 7 jogos, nenhum gol
2006 (5º lugar) - 4 jogos, nenhum gol

Foto: Getty Images

quinta-feira, maio 27, 2010

Os 23 da Copa (IV) - Juan: elegância na zaga

O carioca Juan Silveira dos Santos sempre se destacou pela categoria e técnica no trato com a bola. Disputando a final do Mundial Sub-17 do Equador, em 1995, contra Gana, marcou um belo gol de calcanhar, mas não evitou a derrota brasileira por 3 x 2. No ano seguinte, foi o vice-artilheiro do Flamengo no Estadual de Juvenis, com 13 gols. Detalhe: era, e ainda é, zagueiro.

Desde sua chegada à Gávea, quando tinha apenas 11 anos, Juan sempre mostrou ser um jogador diferenciado dentro da posição, aliando a boa técnica a uma ótima impulsão e segurança no desarme, apesar do físico esguio e aparentemente franzino. O sucesso estendeu-se à camisa amarela: passou por todas as seleções amadoras. Visto como grande promessa, cedo foi promovido ao time profissional do Flamengo, em 1996, com apenas 17 anos.

Logo a decisão mostrou-se precipitada. Ficando quase sempre na reserva e perdendo ritmo de jogo, Juan não conseguiu manter uma boa seqüência ao entrar na equipe, que estava em péssima fase. Contudo, eventualmente mostrava sua categoria marcando gols decisivos, como o que eliminou o Internacional na Copa do Brasil de 1997 e, principalmente, em um tento belíssimo diante do Olimpia do Paraguai pela extinta Supercopa Libertadores, com uma arrancada fulminante seguida de uma meia-lua no beque adversário e a conclusão na saída do goleiro.

Foi reconduzido aos juniores para ganhar mais experiência. E logo retornou ao quadro principal, em 1999, mesmo ano em que disputou o Sul-Americano e o Mundial Sub-20 pela Seleção. Assumiu a camisa titular e festejou o quarto tricampeonato estadual da história rubro-negra.

Na conquista do tri, tinha a seu lado Gamarra, um de seus melhores "professores" no início da carreira e, igualmente, famoso por esbanjar elegância na posição. O becão paraguaio, do alto de sua experiência, ainda revelou: "Tecnicamente falando, ele é o melhor companheiro de zaga que já tive". Pena que a dupla durou pouco tempo. Gamarra logo foi jogar no AEK Atenas da Grécia e Juan passou a dividir a zaga com jogadores de (muito) menos gabarito, como os estabanados Fernando, Valnei e Leonardo Valença.

Mesmo assim, Juan já havia conquistado destaque suficiente para chegar à Seleção principal. Convocado pela primeira vez por Emerson Leão, seguiu tendo oportunidades com Luiz Felipe Scolari. Sua presença chegou a ser dada como certa no Mundial de 2002, mas na última hora, Felipão surpreendeu, preferindo levar mais um jogador de meio-campo, no caso o corintiano Vampeta, que por sinal estava em péssima fase.

Mal se refez do baque, Juan tomou o rumo do futebol alemão, negociado por 3,2 milhões de dólares com o Bayer Leverkusen. Lá, chegou com moral, comparado ao campeão mundial Aldair, outro ex-rubro-negro que brilhou intensamente na Europa. Tinha ainda a vantagem de atuar numa equipe repleta de brasileiros, entre eles o também beque Lúcio, este integrante da equipe pentacampeã no Japão e na Coréia do Sul.

Logo se firmou e fez uma das melhores duplas de zaga da Alemanha, aliando sua técnica apurada ao estilo mais vigoroso de Lúcio. E o prêmio foi o retorno à Seleção pelas mãos de Carlos Alberto Parreira.

Após boas participações na Copa América de 2004 e na Copa das Confederações do ano seguinte, ambas conquistadas sobre os eternos rivais argentinos, Juan firmou-se como titular da zaga. No Mundial de 2006, reeditou a bem-sucedida parceria que havia estabelecido com Lúcio, já à época defendendo o Bayern Munique. Formaram uma dupla sólida e atuaram em todas as partidas sem jamais serem substituídos, estando entre os poucos jogadores poupados das críticas após mais uma doída eliminação diante dos franceses.

Trocou o Bayer pela Roma no ano seguinte, firmando-se no duro futebol italiano. E a dupla com Lúcio manteve-se inabalável na Seleção. A única dúvida sobre o futuro do ex-flamenguista no Mundial da África do Sul recai sobre sua atual condição física, um tanto incerta após várias contusões musculares sofridas nos últimos anos. Se estas não incomodarem, será uma vez mais garantia de segurança lá atrás.


Juan Silveira dos Santos
zagueiro
Rio de Janeiro (RJ), 01.02.1979
1,82 m
73 kg
Clubes: Flamengo (1996 a 2002), Bayer Leverkusen-ALE (2002 a 2007) e Roma-ITA (desde 2007).
Títulos: carioca (1999/2000/01), da Copa Mercosul (1999) e da Copa dos Campeões (2001) pelo Flamengo; da Copa da Itália (2008) pela Roma; da Copa América (2004 e 2007) e da Copa das Confederações (2005 e 2009) pela Seleção Brasileira.
Jogos pela Seleção: 75 (7 gols)
Participação em Copas:
2006 (5º lugar) - 5 jogos, nenhum gol

Foto: Getty Images

quarta-feira, maio 26, 2010

Os 23 da Copa (III) - Lúcio: raça e liderança

Uma goleada humilhante deu a Lucimar Ferreira da Silva a chance de se projetar para o futebol brasileiro e, depois, para o mundo. O então jovem zagueiro do modesto Guará, clube da Capital Federal, fez parte da equipe que enfrentou o Internacional em fevereiro de 1997, pela Copa do Brasil, no acanhado Estádio da Cave. O Colorado foi impiedoso: aplicou sonoros 7 x 0 e eliminou o humilde rival sem a necessidade da disputa da partida de volta. Contudo, o técnico Celso Roth ficou impressionado com o futebol do camisa 3 adversário, e fez questão de levá-lo a Porto Alegre.

Lá, Lucimar se tornou simplesmente Lúcio. Aprovado nos testes, ficou em definitivo no Beira-Rio e, por ser ainda muito jovem, foi ganhar experiência nos juniores. Suas primeiras incursões no time principal se deram no Brasileiro de 1999, em uma equipe que esteve ameaçadíssima de rebaixamento. Lúcio deu sua contribuição, marcando um importantíssimo gol numa vitória sobre a Ponte Preta. E no final, um dramático 1 x 0 sobre o Palmeiras, gol do veterano Dunga, em jogo que teve direito até a um suspeitíssimo apagão, o Colorado pôde enfim respirar tranquilo.

Na temporada seguinte, com uma equipe um pouco melhor armada, Lúcio assumiu a condição de titular e logo se destacou. Seu futebol de grande luta e entrega durante os 90 minutos agradaram em cheio ao torcedor. As arquibancadas ainda vibravam com suas constantes arrancadas ao ataque, que eventualmente rendiam belos gols, como um tirambaço de fora da área que fulminou o Corinthians na Copa JH, o (patético) Campeonato Brasileiro daquele ano.

Também em 2000, Wanderley Luxemburgo o convocou para a Seleção que disputaria os Jogos Olímpicos de Sydney. Até hoje muitos lamentam que Lúcio tenha sido reserva de uma zaga titubeante formada por Fábio Bilica e Álvaro. Mas o becão teve sua chance de aparecer na fatídica eliminação diante de Camarões, nas quartas-de-final: após dar uma de suas costumeiras arrancadas, tabelar com Roger (então do Fluminense e atualmente no Cruzeiro) e não receber a bola de volta, enfureceu-se e após ríspida discussão, desferiu uma cabeçada no rosto do meia carioca. A cena inusitada dividiu opiniões pelo Brasil: uns condenaram enfaticamente, outros aplaudiram o zagueirão.

O ato de indisciplina não o prejudicou na Seleção, pelo contrário. Um dos poucos que saíram de Sydney sem arranhões na imagem, Lúcio logo garantiu um lugar na equipe principal, primeiro na fugaz passagem de Emerson Leão, depois com Luiz Felipe Scolari. E deu adeus ao Inter em janeiro de 2001, negociado com o Bayer Leverkusen, clube alemão famoso por suas constantes apostas em jogadores brasileiro.

Na Alemanha, Lúcio se firmou rapidamente e virou unanimidade entre torcedores e jornalistas. O problema era a "zica" que teimava em não largar seu clube: na temporada 2001/02, o Bayer amargou nada menos que três vice-campeonatos, no campeonato nacional, na Copa da Alemanha e, especialmente, na Liga dos Campeões, título perdido graças a um gol antológico, de sem-pulo, do cracaço francês Zinedine Zidane, do Real Madrid.

A Copa do Mundo do Japão e da Coréia do Sul era a oportunidade de ouro para Lúcio salvar aquela temporada infeliz. Titular absoluto do técnico Felipão, apesar de algumas escorregadas nas Eliminatórias e amistosos preparatórios, Lúcio disputou um Mundial regularíssimo, salvo por um lance: contra a Inglaterra, pelas quartas-de-final, cometeu uma falha grotesca e permitiu a Owen abrir o marcador; para sua sorte, Rivaldo e Ronaldinho Gaúcho salvaram a pátria aquele dia e garantiram a classificação. Na semifinal contra a Turquia e, principalmente, na final contra a Alemanha, duas atuações seguríssimas garantiram a Lúcio recuperar o crédito com a torcida. O penta salvou o 2002 do becão.

Parreira reassumiu o selecionado, mas Lúcio permaneceu entre os titulares, embora sempre contestado. A torcida o acusava de ser atabalhoado, até mesmo raçudo em demasia, com suas avançadas constantes para o ataque e os botes impensados nos atacantes. Mas na Alemanha, ele já era rei: em 2004, foi negociado com o poderoso Bayern Munique por nada desprezíveis 12 milhões de euros. E, diante da maior torcida da Alemanha, seu cartaz só fez crescer. Para melhorar ainda mais, pôde, nas temporadas seguintes, enfim comemorar os títulos que teimavam em lhe escapar nos tempos de Leverkusen.

O reconhecimento do torcedor brasileiro veio no Mundial de 2006, no mesmo país onde atuava e que já reconhecia seu talento. Formando uma dupla impecável com Juan, Lúcio garantiu a segurança da zaga e, apesar de mais uma doída derrota para a França de Zidane, foi dos poucos jogadores daquele grupo a saírem da Copa sem qualquer chamuscão. De quebra, ainda bateu o recorde do paraguaio Gamarra, estabelecido em 1998, de minutos jogados sem cometer qualquer falta: foram 386, 3 a mais que o estabelecido pelo clássico defensor da Albirroja. A primeira infração no torneio veio apenas aos 25 minutos da fatídica partida das quartas-de-final contra Les Bleus.

Depois disso, enfim uma unanimidade, arrebatou a faixa de capitão. Foi o herói da conquista da Copa das Confederações, em 2009, com um golaço de cabeça quase no final que estabeleceu a dramática virada sobre os Estados Unidos na decisão. Devido à chegada do técnico holandês Louis Van Gaal, notório por seus desentendimentos com jogadores brasileiros nas equipes que dirigiu, em especial o Barcelona nos anos 90, trocou o Bayern pela igualmente campeoníssima Internazionale de Milão, onde fez uma temporada perfeita: a tríplice coroa, com direito à reconquista do título europeu após 45 anos de espera, e a titularidade absoluta em uma equipe estrelada até no banco de reservas.

Novamente fazendo dupla com o refinado Juan, Lúcio chega à sua terceira Copa tendo, pela primeira vez em um Mundial, a admiração e confiança irrestrita do futebol brasileiro. Erguer a taça, no dia 11 de julho, será a cereja do bolo.


Lucimar Ferreira da Silva
zagueiro
Brasília (DF), 08.05.1978
1,88 m
80 kg
Clubes: Guará-DF (1996/97), Internacional (1998 a 2000), Bayer Leverkusen-ALE (2000 a 2004), Bayern Munique-ALE (desde 2004) e Internazionale-ITA (desde 2009).
Títulos: alemão (2005/06 e 2008) e da Copa da Alemanha (2005/2006 e 2008) pelo Bayern Munique; italiano (2010), da Copa da Itália (2010) e da Liga dos Campeões da Europa (2010) pela Internazionale; mundial (2002) e da Copa das Confederações (2005 e 2009) pela Seleção Brasileira
Jogos pela Seleção: 93 (5 gols)
Participação em Copas:
2002 (campeão) - 7 jogos, nenhum gol
2006 (5º lugar) - 5 jogos, nenhum gol


Foto: AP Photo

quinta-feira, maio 20, 2010

Os 23 da Copa (II) - Maicon: força e velocidade pela direita


Maicon Douglas Sisenando nasceu predestinado a ser jogador. Seu pai, Manoel, era um vigoroso defensor do Novo Hamburgo, o tradicional "Nóia", equipe da cidade gaúcha de mesmo nome distante 42km de Porto Alegre. Sonhando ver o garoto e seu gêmeo Marlon trilhando o mesmo caminho, utilizou-se de uma curiosa simpatia: pegou os cordões umbilicais dos filhos e os enterrou no gramado do Estádio Santa Rosa.

Logo a família mudou-se para Santa Catarina, estabelecendo-se em Criciúma, a famosa "Capital do Carvão". Pequeno e mirrado quando garoto, bem ao contrário do "tanque" de agora, iniciou sua trajetória nos gramados pelas categorias de base da equipe local, aos 13 anos. O irmão Marlon, seu companheiro no início da caminhada, logo viria a desistir do sonho de ser jogador, optando por se dedicar integralmente aos estudos e formar-se em Educação Física.

Deslocado do meio-campo para a lateral-direita, encontrou a posição ideal para exercer seu futebol marcado por um misto de velocidade, vigor físico e, porque não, alguma habilidade. Chamou a atenção do Cruzeiro, que o levou ainda amador para Minas. E logo chegaria às seleções de base, sendo titular da equipe Sub-20 do Brasil campeã sul-americana da categoria e que disputou o Mundial na Argentina em 2001, ao lado de outras futuras estrelas, como Kaká e Adriano.

Em 2003, chegou à equipe pré-olímpica, disputando torneios no Qatar e Estados Unidos, e começando a garantir sua posição visando os Jogos de Atenas. No clube, ainda aguardava por uma chance real de ser titular: após disputar a posição por duas temporadas com jogadores como Neném e Ruy "Cabeção", via do banco o ex-santista Maurinho "voar" em campo e brilhar junto com o resto do belo time que ganhou a "Tríplice Coroa" naquele ano.

Começou 2004 em boa fase. O Brasil decepcionou no Pré-Olímpico do Chile e não conseguiu vaga para a competição na Grécia. Contudo, Maicon atuou bem e até fez um gol de placa, diante do Paraguai, que alguns até compararam ao marcado por Maradona diante da Inglaterra na Copa de 1986. Aproveitando-se de um momento de deslumbramento e início de má-fase de Maurinho, ganhou a camisa 2 titular do Cruzeiro.

Não teve muito tempo para apreciá-la, sendo logo negociado com o Monaco. Ao mesmo tempo, iniciava sua trajetória na Seleção principal, sendo campeão da Copa América no mesmo ano; já em 2005, perdeu na Copa das Confederações a disputa para o são-paulino Cicinho pela reserva de Cafu e, consequentemente, a chance de fazer parte do grupo de Parreira no Mundial da Alemanha.

Depois de dois bons anos no Monaco, chegou à Inter de Milão, e o momento não poderia ser melhor. Começava ali o domínio humilhante que os nerazzuri impõem a seus rivais da Bota até os dias de hoje. Maicon, antes visto por muitos por um jogador tão atabalhoado e grosso quanto forte e veloz, começou uma incrível evolução como atleta, agora firme na marcação, de eficiência bastante satisfatória nos cruzamentos e chutes temíveis de longa distância.

Não demorou a tomar conta da 2 da Seleção, aproveitando-se da timidez inicial com a amarelinha do principal concorrente, Daniel Alves, que brilhava intensamente no Sevilla mas não repetia nem de longe o mesmo desempenho na equipe de Dunga. O ex-jogador do Bahia firmou-se no grupo com o tempo, mas aí já era tarde para roubar a posição de Maicon.

Hoje, o ex-cruzeirense é tido como peça indispensável ao esquema tático da Seleção, ajudando a "desafogar" o jogo com suas arrancadas pela direita. E talvez até venha a atuar ao lado de seu, por enquanto, reserva, cujo aproveitamento no meio-campo tem se mostrado bastante viável e não descartado pelo treinador. Sorte do Brasil, que conta talvez com os dois melhores laterais-direitos do mundo na atualidade ao mesmo tempo.


Maicon Douglas Sisenando
lateral-direito
Novo Hamburgo (RS), 26.07.1981
1,84 m
77 kg
Clubes: Cruzeiro (2001 a 2004), Monaco-FRA (2004 a 2006) e Internazionale-ITA (desde 2006).
Títulos: mineiro (2003/04), do Supercampeonato Mineiro (2002), brasileiro (2003), da Copa do Brasil (2003) e da Copa Sul-Minas (2001/02) pelo Cruzeiro; italiano (2007/08/09/10) e da Copa da Itália (2010) pela Internazionale; sul-americano Sub-20 (2001), da Copa América (2004 e 2007) e da Copa das Confederações (2005 e 2009) pela Seleção Brasileira.
Jogos pela Seleção: 69 (6 gols)
Participação em Copas: estreante

Foto: Getty Images

quarta-feira, maio 19, 2010

Os 23 da Copa (I) - Júlio César: segurança extrema


Perto de completar 31 anos, Júlio César ainda é relativamente jovem, especialmente para os padrões de um goleiro, posição normalmente de grande longevidade. Ao mesmo tempo, é certamente um jogador de grande experiência. Sua estréia profissional no Flamengo deu-se já aos 17 anos, em maio de 1997, justamente em um clássico contra o Fluminense, no Maracanã.

Substituindo o veterano Zé Carlos, não comprometeu, apesar da derrota por 2 x 0. Pelo contrário: fez ótimas defesas e até pegou um pênalti. Foi imediatamente profissionalizado, passando a ser reserva imediato do também experiente Clemer, contratado no mesmo ano para substituir o antigo titular, que foi para o Vitória.

Em 1999, defendeu a Seleção Brasileira Sub-20 na disputa dos campeonatos sul-americano e mundial da categoria (no segundo, perdeu a posição de titular às vésperas da competição para Fábio, atualmente no Cruzeiro). E a cada falha do inconstante Clemer, seu nome era pedido pela torcida rubro-negra para assumir a camisa 1, o que finalmente ocorreu durante a Copa João Havelange, no ano seguinte.

Em 2001, ajudou o Fla nas conquistas do tricampeonato estadual e da Copa dos Campeões. E começou a ser convocado para a Seleção principal, como terceiro goleiro, atrás de Marcos e Dida. Seu nome era dado como certo no Mundial de 2002, no Japão e na Coréia do Sul, pois Luiz Felipe Scolari tinha o objetivo de levar um arqueiro jovem, a fim de “prepará-lo” para uma possível titularidade na Copa seguinte.

Contudo, a imaturidade de Júlio César acabou jogando contra. Deslumbrado e considerando-se garantido no grupo, soltou declarações pouco humildes em algumas entrevistas, o que acabou irritando Felipão. O treinador acabou, enfim, levando o são-paulino Rogério Ceni para o lugar. Para compensar a frustração, Júlio deu-se bem no campo pessoal, casando-se na mesma época com a bela atriz e modelo Suzana Werner, (ex de Ronaldo “Fenômeno”), com quem está até hoje.

Seguiu seu trabalho no Flamengo, como ídolo inconteste da galera rubro-negra. Seu amor sincero pelo clube, porém, vez ou outra proporcionava situações constrangedoras. Na semifinal do Estadual de 2003, sofrendo uma goleada impiedosa (0 x 4) diante do Fluminense, tendo falhado em pelo menos um dos gols, e após ver o rival dar um “olé” humilhante, tocando a bola de pé em pé por quase dois minutos, Júlio César roubou a bola de um atacante tricolor e arrancou com ela nos pés até o campo de ataque, quase proporcionando um contra-ataque e mais um gol adversário. Após a partida, foi duramente criticado por Evaristo de Macedo e reagiu desastradamente contra o veterano treinador, chamando-o de “burro”. Depois, voltaram às boas.

Com o retorno de Parreira e Zagallo (que o guindou à condição de titular no Flamengo) à Seleção, Júlio continuou sendo chamado, agora como reserva imediato de Dida. A imprensa (logicamente, a de fora do Rio...) nunca gostou muito da idéia. Logo surgiram rumores de que o rubro-negro só estaria sendo chamado por ter como seu procurador Paulo Zagallo, justamente o filho do auxiliar-técnico da Seleção.

As críticas só cessaram um pouco com a Copa América de 2004. Titular na competição graças à ausência de Dida (bem como dos demais “estrangeiros” titulares, poupados por Parreira), destacou-se durante todo o torneio, especialmente com os pênaltis defendidos na semifinal diante do Uruguai (reabilitando-se de um frango sofrido no tempo normal) e na final contra a Argentina, ajudando a garantir o título.

Com o final do contrato com o Flamengo, rumou para a Europa. Assinou com a tradicional Internazionale de Milão, passando antes por um “estágio” de seis meses no Chievo de Verona. Aproveitando-se da contusão do veterano titular Toldo, ganhou a posição de titular, mantida até hoje e só perdida por um breve período no final da temporada 2005/06.

Esteve entre os 23 na Copa da Alemanha, condição que não chegou a correr riscos; afinal, Parreira sempre deixou muito claro que não tinha interesse em chamar três goleiros veteranos, como ocorreu em 2002, preferindo chamar pelo menos um jogador mais jovem. Sem perspectivas de atuar naquele Mundial, contentou-se com a segunda suplência do gol, de olho firme na possível titularidade de 2010, já sabendo que dificilmente teria que enfrentar novamente a forte concorrência dos experientes Dida, Marcos e Rogério Ceni.

E assim ocorreu. Após algumas chances concedidas pelo iniciante técnico Dunga a outros arqueiros, como Gomes e Doni, assumiu definitivamente a camisa 1 da Seleção após a Copa América, jamais tendo corrido qualquer risco de perdê-la desde então. Atingiu seu auge em uma campeoníssima Inter que, impulsionada pelos investimentos nada modestos e até exagerados do presidente Moratti, além da decadência pós-CalcioCaos dos rivais Milan e Juventus, saltou de um jejum de 17 anos sem conquistas nacionais para o atual pentacampeonato italiano e uma iminente reconquista do título europeu após 45 temporadas. Após atuações de gala por seu clube e pelo Brasil, em especial contra o Equador, quando salvou a Seleção de uma derrota acachapante, atingiu a unanimidade nacional, inclusive perante a opinião pública paulista que tanto o contestava alguns anos antes.

Tido por muitos órgãos de imprensa internacionais como um dos três melhores goleiros do mundo na atualidade (quando não o melhor), Júlio César é uma das peças vitais da equipe que Dunga escalará na Alemanha. O título mundial, no ápice de sua carreira, certamente significaria sua consagração definitiva como um dos maiores nomes da posição na história do futebol brasileiro.


Júlio César Soares Espíndola
goleiro
Rio de Janeiro (RJ), 03.09.1979
1,86 m
79 kg
Clubes: Flamengo (1997 a 2004), Chievo-ITA (2005) e Internazionale-ITA (desde 2005).
Títulos: carioca (1999/2000/2001 e 2004), da Copa dos Campeões (2001) e da Copa Mercosul (1999) pelo Flamengo; italiano (2006/07/08/09/10) e da Copa da Itália (2006 e 2010) pela Internazionale; da Copa América (2004) e da Copa das Confederações (2005 e 2009) pela Seleção Brasileira.
Jogos pela Seleção: 47 (31 gols sofridos)

Participação em Copas:
2006 (5º lugar) - nenhum jogo

Foto: Getty Images